Na Semana Santa, celebramos a entrada triunfante de Jesus em Jerusalém e cada passo de sua entrega, desde a Eucaristia, passando pela sua paixão e morte na cruz, até a ressurreição, de forma que cada dia desta semana se reveste de uma profunda espiritualidade.
É nesse clima espiritual que a liturgia nos convida a viver esses dias com alegria e renovada esperança. E, através da Palavra de Deus, das orações e dos gestos, todas as celebrações abrem para nós, que somos discípulos do Ressuscitado, horizontes luminosos de vida em plenitude.
Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor – O domingo que abre a semana santa recebe esse nome porque, no mesmo dia, celebram-se os dois aspectos onde Cristo se humilhou e Deus o exaltou. Ambos são apresentados na acolhida de Jesus como simples rei, porém esperado e aclamado como tal, e na narrativa da sua Paixão. A liturgia do Domingo de Ramos destaca a humildade como fundamento da obediência. A palavra “obediência”, nos idiomas mais antigos, significa “prestar atenção”, “dar ouvidos”. A obediência de Jesus ao Pai significa, antes de tudo, que Jesus levou ao pleno cumprimento o projeto de amor de Deus para com a humanidade. Nem mesmo nos momentos difíceis, Jesus voltou atrás no que ensinou e no que mostrou na própria vida a respeito de Deus e de seu reino de fraternidade universal.
De segunda a quarta-feira, acontece a preparação mais imediata da Páscoa, onde a Igreja contempla o Servo sofredor. A liturgia reconstitui os acontecimentos que o Senhor viveu nos últimos dias de sua vida terrena. E cada dia é marcado pelo Evangelho próprio que ilumina a semana derradeira de Jesus.
Segunda-Feira da Semana Santa – No Evangelho segundo João (12, 1-11), a presença de Lázaro, a quem Jesus ressuscitou, marca o forte anúncio da própria ressurreição do Senhor.
Terça-Feira da Semana Santa – João (13, 21-33.36-38) nos situa na santa ceia e nos confronta com a posição tomada por cada um dos apóstolos diante de Jesus.
Quarta-Feira da Semana Santa – Situamo-nos no Evangelho segundo Mateus (26, 14-25), que nos apresenta três momentos. O primeiro: Judas que negocia com os sumos sacerdotes a entrega de Jesus no valor de trinta moedas de prata. O segundo: é a preparação para comer a páscoa, feita pelos discípulos a mando de Jesus. O terceiro: é Jesus em torno da mesa com os seus.
Esse trecho do Evangelho, bem como toda a liturgia deste dia, pede perseverança e firmeza nos momentos difíceis da missão. Ora, Jesus sabe que um dos seus discípulos vai traí-lo. E o que é pior: o traidor é aquele que come com ele, ou seja, é aquele que conviveu com Jesus, que tem proximidade, que é amigo. É aquele que poderia muito bem ter aproveitado a amizade de Deus, a confiança de Jesus, o dom do Espírito Santo, mas infelizmente não o quis. E é a respeito deste que Jesus diz: ai daquele que trair o Filho do Homem! Isso porque Judas perdeu tudo, ou seja, perdeu o maior bem que qualquer pessoa pode ter: Deus.
Quinta-feira da semana santa – É um dia marcado por três momentos distintos:
Pela manhã, é celebrada a Missa Crismal, a Missa da Unidade. A Missa Crismal é celebrada na manhã da Quinta-Feira Santa na Catedral diocesana. Nela, estão presentes o bispo diocesano, o bispo emérito, os padres, religiosos, religiosas, seminaristas e todo o povo de Deus. São abençoados os óleos que serão usados na celebração dos Sacramentos como o Batismo, Crisma, Unção dos Enfermos e Ordem. E os padres renovam suas promessas sacerdotais e o povo renova a sua missão.
No entardecer ou no início da noite, inicia-se o Tríduo Pascal com a Missa da Ceia do Senhor e do Lava-pés. Na Missa da Ceia do Senhor, celebram-se os mistérios da última Ceia, apresentados em São João (13, 1-15) e que são: o Novo Mandamento do Amor, pelo lava-pés;
a Eucarístia, na qual Cristo se dá como alimento; e o sacerdócio ministerial instituído pelo próprio Cristo.
Finalmente, a Ceia do Senhor é encerrada quando o sacerdote leva as hóstias consagradas para um lugar dignamente preparado e ali o Santíssimo Sacramento é adorado por algumas horas da noite. Também são lembradas, nesta noite, a oração, a agonia e a prisão de Jesus.
Sexta-Feira da Semana Santa – “Nós nos gloriamos na cruz de Nosso Senhor, que hoje resplandece como o novo mandamento do amor”. Hoje é o dia da Paixão de Cristo. Paixão do Senhor de nossas vidas. Paixão ou sofrimento que começou na noite de quinta para sexta-feira, no horto das oliveiras. Paixão ou sofrimento pela traição do amigo, pela prisão, pelos questionamentos dos líderes religiosos e políticos, pelo abandono dos discípulos, e tantas outras coisas. Paixão ou sofrimento revestido e motivado por uma certeza e decisão: amar, amar a todos e amar até o fim.
Celebramos o dia em que o Esposo foi tirado. O Esposo da Igreja foi tirado. O Esposo é Cristo e a Igreja somos todos nós. Por isso, esse dia é de silêncio, jejum e abstinência. É o dia em nós, como Igreja, nos debruçamos totalmente sobre o sacrifício da cruz, rezando a Via-Sacra e celebrando a Paixão do Senhor, na mesma hora em que Cristo morreu por nós.
Nesta sexta-feira, somos convidados a mergulhar nos mistérios da Páscoa da Paixão, participando da celebração da Palavra que tem como centro a narração da paixão de Jesus, segundo São João (capítulo 18), e como ponto culminante a adoração da santa Cruz.
Que, no silêncio deste dia, contemplando e adorando o Crucificado, cheguemos ao reconhecimento de seu mistério: “De fato, esse homem era mesmo o Filho de Deus”. Solidários com os sofrimentos do divino Redentor e dos membros de seu Corpo, recebamos força para viver da esperança e da vitória que nasce da Cruz.
“Cristo! Pela sua dolorosa paixão, tende piedade de nós e do mundo inteiro!”.
Sábado Santo – “Cristo por nós padeceu, morreu e foi sepultado: vinde todos adoremos”. Celebramos, neste dia, a sepultura do Senhor e aguardamos, na esperança, a sua ressurreição.
Hoje, enquanto o Esposo dorme, a esposa se cala. Mas quem é o esposo que dorme? E quem é a esposa que cala? O Esposo é Cristo, e ele dorme o sono da morte, não a morte eterna, mas a morte corporal, da qual homem algum pode escapar. A esposa é a Igreja que se curva sobre o mistério da Cruz. Hoje, o Senhor desceu à mansão dos mortos, conforme nos conta uma antiga homilia no grande Sábado santo, no século IV.
A descida do Senhor à mansão dos mortos
Que está acontecendo hoje? Um grande silêncio reina sobre a terra. Um grande silêncio e uma grande solidão. Um grande silêncio, porque o Rei está dormindo; a terra estremeceu e ficou silenciosa, porque o Deus feito homem adormeceu e acordou os que dormiam há séculos. Deus morreu na carne e despertou a mansão dos mortos.
Ele vai antes de tudo à procura de Adão, nosso primeiro pai, a ovelha perdida. Faz questão de visitar os que estão mergulhados nas trevas e na sombra da morte. Deus e seu Filho vão ao encontro de Adão e Eva cativos, agora libertos dos sofrimentos.
O Senhor entrou onde eles estavam, levando em suas mãos a arma da cruz vitoriosa. Quando Adão, nosso primeiro pai, o viu, exclamou para todos os demais, batendo no peito e cheio de admiração: “O meu Senhor está no meio de nós”. E Cristo respondeu a Adão: “E com teu espírito”. E tomando-o pela mão, disse: “Acorda, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos, e Cristo te iluminará”.
“Eu sou o teu Deus e por tua causa me tornei teu filho; por ti e por aqueles que nasceram de ti, agora digo, e com todo o meu poder, ordeno aos que estavam na prisão: ‘Saí!’; e aos que jaziam nas trevas: ‘Vinde para a luz!’; e aos entorpecidos: ‘Levantai-vos!’”
“Eu te ordeno: acorda, tu que dormes, porque não te criei para permaneceres na mansão dos mortos. Levanta-te dentre os mortos; eu sou a vida dos mortos. Levanta-te, obra das minhas mãos; levanta-te, ó minha imagem, tu que foste criado à minha semelhança. Levanta-te, saiamos daqui; tu em mim e eu em ti, somos uma só e indivisível pessoa.”
“Por ti, eu, o teu Deus, me tornei um filho; por ti, eu, o Senhor, tomei tua condição de escravo. Por ti, eu, que habito no mais alto dos céus, desci à terra e fui até mesmo sepultado debaixo da terra; por ti, feito homem, tornei-me como alguém sem apoio, abandonado entre os mortos. Por ti, que deixaste o jardim do paraíso, ao sair de um jardim fui entregue aos judeus, e, num jardim, crucificado”.
“Vê, em meu rosto, os escarros que por ti recebi, para restituir-te o sopro da vida original. Vê na minha face as bofetadas que levei para restaurar, conforme a minha imagem, a beleza corrompida. Vê, em minhas costas, as marcas dos açoites que suportei por ti para retirar de teus ombros o peso dos pecados. Vê minhas mãos fortemente pregadas à árvore da cruz, por causa de ti, como outrora estendestes levianamente as tuas mãos para a árvore do paraíso”.
“Adormeci na cruz e por tua causa a lança penetrou no meu lado, como Eva surgiu do teu, ao adormeceres no paraíso. Meu lado curou a dor do teu lado. Meu sono vai arrancar-te do sono da morte. Minha lança deteve a lança que estava dirigida contra ti”.
“Levanta-te, vamos daqui. O inimigo te expulsou da terra do paraíso; eu, porém, já não te coloco no paraíso, mas num trono celeste. O inimigo afastou de ti a árvore, símbolo da vida; eu, porém, que sou a vida, estou agora junto de ti. Constitui anjos que, como servos, te guardassem; ordeno agora que eles te adorem como Deus, embora não sejas Deus”.
“Está preparando o trono dos querubins, prontos e a postos os mensageiros, construído o leito nupcial, preparado o banquete, as mansões e os tabernáculos eternos adornados, abertos os tesouros de todos os bens e o reino dos céus preparado para ti desde toda a eternidade”.
(Liturgia das Horas, tempo da Quaresma. p. 439s).
Que o recolhimento deste dia nos prepare para que, à noite, na Vigília Pascal, possamos nos unir a todo o universo que romperá o grande silêncio com o canto do “ALELUIA”, aclamando Nosso Senhor Jesus Cristo, que vive e reina para sempre!
Vigília Pascal na Noite Santa – Não celebramos um acontecimento do passado, mas realizamos uma travessia, com Cristo. Como os hebreus atravessaram o mar Vermelho, assim nós, com Cristo, atravessaremos o mar do pecado e da morte para uma vida nova em Cristo. Realizamos, portanto, essa travessia, com fé e gratidão a Deus, que não nos deixou escravizados no Egito do pecado e da morte, mas que nos resgatou pela paixão, morte e ressurreição de seu Filho, Jesus Cristo, nosso Senhor.
Domingo da Páscoa – “Aleluia, aleluia! Este é o dia que o Senhor fez para nós, alegremo-nos e nele exultemos! Aleluia, aleluia!” Que alegria, Cristo ressurgiu! Não está morto, mas é o Vivente. Ele ressuscitou dos mortos e vai à nossa frente para a Galileia.
Chegamos ao grande dia, o dia da Páscoa, é um novo dia, uma nova semana, e tudo se renova, pois eis que Cristo nossa páscoa foi imolado. A maior festa do cristianismo é a ressurreição de Jesus Cristo, pois se trata de um acontecimento que está no centro da experiência religiosa que Jesus Cristo fez de Deus, é o cume do caminho feito por ele. Com sua ressurreição os discípulos de Jesus descobrem quem ele é, qual sua missão, qual é seu futuro e qual é a nossa missão.
Oremos a Cristo, autor da vida, a quem Deus ressuscitou dos mortos e que pelo seu poder também nos ressuscitará; e peçamos: CRISTO, NOSSA VIDA, SALVAI-NOS!
Cristo ressuscitou, verdadeiramente ressuscitou. Aleluia! Aleluia!
Desejo a você e sua família, uma Feliz e Santa Páscoa!
Dom Joaquim Wladimir Lopes Dias
Bispo Diocesano de Colatina